Wednesday, February 08, 2006

Crenças e tolerância

As notícias sobre os últimos acontecimentos, ligados às conseqüências das manifestações promovidas por fanáticos islamitas, pela publicação de charges consideradas ofensivas à religião islâmica por um jornal dinamarquês, já dão conta de dezenas de pessoas mortas, prédios incêndiados e depredados.

Outras notícias dão conta da oferta de um prêmio de cem quilos em ouro, que estaria sendo oferecido por um mullah, pela cabeça dos jornalistas que foram os autores das charges e até, pasmem!, cinco quilos de ouro por cada cabeça de soldado dinamarquês, norueguês ou alemão.

"Damos graças a Deus por nos ter contemplado com inimigos tão idiotas" - Com essa frase, o presidente do Iram, Mahmud Ahmadinejad, se manifestou sobre a decisão da Agência Internacional de energia Atómica (AIEA), em enviar para a ONU um dossiê nuclear sobre o país.

Em todo o mundo essas charges alimentaram um caloroso debate sobre a questão da liberdade de expressão. É um assunto tipicamente flammer - que alimenta debates acalorados -, que gera muita discussão e pouco consenso. Na verdade os assuntos são dois, e precisam ser dividos para que a haja a devida compreensão do tema.

Um é reconhecer que só há liberdade de imprensa se garantirmos a liberdade da publicação de qualquer tema, senão não há porque falar em liberdade; até mesmo desenhos como esses, que podem ser de mau gosto, mas isso já é tema para outra discussão.

Dois é acabar com essa insanidade. É um absurdo se pretender que as reações dos fanáticos são justificáveis, quando se sabe que não há a mínima proporção entre a ação e a reação nesse caso. Qual a justificativa plausível para tolerar a intolerância de alguns fundamentalistas religiosos? Aceitar a intolerância é aceitar que se acabe com a própria tolerância.

O próprio presidente do Iram, não estamos, portanto, falando de um fanático qualquer, o homem que nega a existência do holocausto, fala em "inimigos idiotas". Quem são estes inimigos idiotas? O objetivo dos seguidores radicais do Islã não é bem claro? Está nos escritos: morte aos infiéis. Portanto, essa reação violenta dos fanáticos muçulmanos é barbárica e típica da idade média, dos tempos inquisitoriais, onde as blasfêmias eram punidas com a morte dos hereges.

Não se trata de dois pesos e duas medidas, o ocidente tem sabido aceitar e revidar - com civilidade - as críticas que são feitas às religiões ditas ocidentais, caso, por exemplo, do cristianismo. Também não existe liberdade sem responsabilidade, mas uma coisa não deve interferir na outra; há que se seguir um código de ética e os eventuais abusos aos direitos alheios devem ser coibidos pela justiça.

"Uma das mais constantes características gerais das crenças é a sua intolerância. Ela é tanto mais intransigente quanto mais forte é a crença. Os homens dominados por uma certeza não podem tolerar aqueles que não a aceitam". - Gustave Le Bon, in 'As Opiniões e as Crenças'


“A humanidade só saiu da barbárie mental primitiva quando se evadiu do caos das suas velhas lendas e não temeu mais o poder dos taumaturgos, dos oráculos e dos feiticeiros. Os ocultistas de todos os séculos não descobriram nenhuma verdade ignorada, ao passo que os métodos científicos fizeram surgir do nada um mundo de maravilhas. Abandonemos às imaginações mórbidas essa legião de larvas, de espíritos, de fantasmas e de filhos da noite – e que, no futuro, uma luz suficiente os dissipe para sempre.” - Gustave Le Bon, in 'As Opiniões e as Crenças'

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